domingo, 6 de março de 2011

Bioantropologia X Antropologia Física: Algumas Diferenças Históricas



A diferença entre a Antropologia Biológica/Bioantropologia e a Antropologia Física está na constituição histórica e metodológica em relação à Antropologia atual. Ainda no século XVIII, o estudo da antropologia esteve baseado em análises morfológicas (antropometria, de medição de corpos humanos) de populações em geral e a característica que predominava no período moldava-se a partir da fisiologia humana, da compreensão compartimentada do Homem (do ser humano), sem a análise do contexto social e do homem inserido em sua cultura. Esse método de abordagem da morfologia humana ficou conhecido como “determinismo biológico”, especialmente em nossa contemporaneidade, com os processos de “eugenia” do século XX, com a conceituação das “raças humanas” que seriam superiores umas às outras, onde a “raça negra” tenderia a sofrer as conseqüências econômicas, sociais, morais, intelectuais e humanas (com a “desumanização dos negros”) em relação à “raça branca”. Particularmente com o avanço do sistema capitalista de produção e períodos de pós-guerra mundiais, os estudos de antropologia física sofreram deturpação substancial sobre os estudos do Homo sapiens sapiens, todavia, o ser humano enquanto um ser biocultural é o “conceito” ou a análise atualmente defendida pela Bioantropologia em sua constituição holística da realidade social humana.
A antropologia biológica compreende o ser humano como uma criatura que, ao mesmo tempo em que passou por períodos de sagas evolutivas há pelo menos sete milhões de anos, esteve em consonância com processos históricos e culturais e que, passando por períodos de adaptação, que começa com o bipedalismo, atravessa a constituição de cérebro grande e complexo, a construção de ferramentas líticas, a descoberta do fogo, a refletância da cor da pele através de migrações partindo de África, a constituição da arte rupestre e, finalmente, a articulação da linguagem humana, até a formação da sociedade complexa de hoje, com novas adaptações climáticas, comportamentais, nutricionais, culturais e evolutivas, processo em constante estado de mudanças e transformações e que tem implicações diversas para a antropologia de maneira ampla.
A Antropologia Biológica ou Bioantropologia é uma ciência que estuda o comportamento humano em seu aspecto geral: estuda os processos evolutivos propriamente ditos, analisando cada período de adaptações ao longo das modificações ambientais do planeta como um todo, particularmente as transformações climáticas e nutricionais, procura compreender a variabilidade das espécies e os estágios de evolução do Homo sapiens sapiens até a constituição de uma anatomia moderna, assim como analisa as relações humanas de saúde e doença, evolução cultural, constituições genéticas, vestígios fósseis e forenses, primatologia, ecologia humana, entre outros.
A implicação da Bioantropologia no contexto mais geral da Antropologia enquanto ciência é a busca da compreensão do homem como um todo, como um ser que faz parte de um sistema complexo que, além de ser social, é biológico, que além de ser anatômico é cultural, que além de ser genético, é humano. A análise da Bioantropologia procura compreender as inúmeras realidades sociais contextualizadas com o ambiente, o meio, a economia, a nutrição de populações (ou dificuldades nutricionais por causa, entre outros fatores, da exclusão social), os processos sócio-ecológicos (da Amazônia e do Brasil), como também procura analisar os aspectos bioculturais do Homem em sociedade, como as relações entre doença e pobreza, entre epidemiologia e mudança comportamental, entre saúde e sociedade, entre endemias e processos culturais (como o HIV, Anemia Falciforme, Pressão Alta, etc.) e os processos de intolerância social com o “Outro”, que é diferente enquanto grupo, porém, igual enquanto ser humano em todos os processos citados anteriormente.
A compreensão da sociedade humana precisa ser realizada a partir de um contexto geral (holístico), que envolve a biologia, a cultura, o comportamento social, hábitos, tradições, ritos, mitos, mudanças físicas e sociais (evoluções), arqueologia, arte, linguagem, gostos, relações de poder, exclusão social, saúde e doença e tantas outras categorias de análise que constituem as áreas de interesse da Antropologia nos quatro campos, por assim dizer.

Texto de Ariana da Silva - Disciplina do Programa de Pós Graduação em Antropologia - PPGA/UFPA: História do Pensamento Antropológico, Dezembro/2010.
Foto feita por Ariana da Silva - Reconstituição facial do fóssil mais antigo das Américas, Luzia, a "primeira brasileira", Museu Nacional do Rio de Janeiro, RJ.

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