
A regulação da sexualidade através de normas jurídicas, de políticas de cuidado com a saúde, com programas juvenis de aconselhamento familiar para mães e pais jovens, a realidade de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST's e AIDS) e a deflagração de direitos reprodutivos e sexuais demarcam sobremaneira o que a sociedade brasileira adotou como "regulamentação" a fim de estabelecer linhas de ação nas políticas públicas na área da saúde (Lei do SUS - 8080/90) e na área jurídica (Direitos Humanos).
A sexualidade juvenil é uma questão que necessita de discussão acerca do contexto social em que jovens de diversas classes sociais estão inseridos, através de fatos, valores morais e éticos, práticas culturais, visões de mundo locais e globais, grupos de pertença e construção de personalidades que possam vir a identificar o "homem" e a "mulher" em torno da garantia de sua própria vida sexual, que é diversa, qual seja: hetero, homo, bi ou transexual.
Muitas práticas sociais que violam direitos humanos podem ter indícios nos processos de segregação social em que homens e mulheres com menor poder aquisitivo (e de poder) estão sujeitos e são submetidos a todo tipo de violência: simbólica, física, social, cultural e humana. A homossexualidade - para tomarmos um exemplo - é alvo de "noções herdadas" de algo que, segundo Bourdieu¹, seria uma espécie de "dominação pelo capital cultural" e que, entretanto, expõe à margem da cidadania diversos grupos sociais que deveriam ter, por Lei e pela própria constituição democrática de "liberdade", seus "direitos" sociais, políticos, jurídicos, sexuais e o "direito a ter direito" garantidos, o que, lamentavelmente, não vem ocorrendo.
Todavia, a luta engajada de movimentos sociais – década de 70 até hoje – como o Feminista e o LGBT, ao longo de processos de revisões de concepções obsoletas (mudanças) nos campos biomédico, jurídico, político e social tem, na medida do possível, avançado no debate, porém, o preconceito persiste e ainda convivemos com uma espécie de desvalorização da diversidade sexual, além da de cor, classe, raça, etnia, gênero, etc.; grupos fadados a toda forma de exclusão social, classificados como "os fora da ordem" e que "não se adaptam às normas" - aos padrões culturais hetero - e, a partir da reprodução social - que acontece, inclusive, na própria escola através de agressões silenciosas - contribui para que a produção da "distinção social" de gostos de classes e estilos de vida e de poder: aquisitivo, de prestígio, acadêmico, coletivo - estimulem o apego a normas e convenções arbitrárias de sexualidade.
O direito reprodutivo - e discriminado - de mães com HIV, a homofobia - estigma do preconceito homossexual -, a reprodução simbólica da violência dentro da própria escola - com mensagens normatizadoras, silenciosas e de consentimento da violência sexual, como hierarquia, caricaturas, desigualdades, insultos, ofensas e mecanismos de exclusão -, o controle de conduta e a adaptação a regras de gênero dominantes (sexismo), que reproduzem a inferiorização da pessoa humana, com alun@s hostilizados e que comprometem o rendimento escolar e trajetórias de vida, marginalizando o (a) cidadão (ã) a uma espécie de "morte ou invisibilidade social" e de negação de sexualidades diversas, como agressões físicas a transexuais - que culminam no abandono escolar e prostituição futura, entre outras consequencias - são alguns pontos que devem servir a reflexões das estruturas sociais que compõem o cenário de busca por, efetivamente, Direitos Humanos e Sexuais na chamada Diversidade Sexual - e humana.
Direitos reprodutivos, sexuais e humanos são normas jurídicas que necessitam de uma abordagem, impreterivelmente, de afirmação de papéis sociais, de afirmação da diversidade sexual, de avanços, lutas e conquistas cotidianas. Como afirma Rios², em seu texto "Para um direito democrático da sexualidade", é na sistematização e organização de normas e condutas éticas de Direitos Reprodutivos, Democracia, Cidadania, Direitos Humanos e Sexuais numa concepção que o autor conceitua como "direito democrático da sexualidade" que, entre outros avanços, constam a ampliação de direitos sociais, políticos, econômicos e humanos em seu sentido universal.
A gravidez na adolescência possui uma simbologia de valorização social da maternidade, como um "rito de passagem" que transforma a "menina" em "mulher", que refaz o caminho da perpetuação do "papel da mulher como reprodutora" e que, no contexto social de jovens de classes menos abastadas, a atitude de ser mãe representa a constituição da vida familiar feliz e segura que não encontra dentro da própria família carregada de incertezas e descontentamentos de toda sorte e que, no entanto, pouco está relacionado ao "direito reprodutivo" propriamente dito, pois reflete justamente um comportamento baseado em limitações de relações de poder estruturantes e que estabelecem regras de desigualdades sociais acentuadas que estão na ordem do dia e precisam de reflexões e projetos formadores de atitudes críticas das experiências e convenções sociais a partir do estabelecimento de diálogos dentro da escola.
O engendramento de abordagens educativas que trabalhem o contexto social e cultural de jovens para que possam discutir o papel da maternidade, da paternidade, fertilidade, esterilidade, AIDS, estigmas, orientações sexuais, prazer, corpo - e o reconhecimento do mesmo -, erotismo, solidariedade, práticas econômicas, creches, educação dos filhos, emprego, renda e principalmente, novas emoções físicas, de envolvimentos, de amor, companheirismo e até mesmo de noções de religiosidade - e lembrar sempre que o Estado é laico, autônomo e que deve refletir na articulação de representações da sociedade civil - assim como em políticas de educação, saúde, saneamento, entretenimento, juventude, oportunidade de renda, direitos humanos, cultura, desportos, lideranças religiosas, ONG's e etc., a fim de contextualizar o que pode ser feito em termos de Direitos Humanos e atitudes solidárias, de reflexões da realidade social e também da construção de um pensamento crítico que possa relativizar o "romantismo" da vida amorosa, sexual, social, política e cultural pautada em relações de poder que moldam comportamentos e impõem regras, a fim de estabelecer caminhos fortuitos que consigam substancialmente discutir direitos de cidadania e de busca por um espaço democrático propriamente dito que possam garantir a diversidade sexual de fato, tão aclamada e urgente na atualidade.
¹ BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. EDUSP, São Paulo, 2007.
2 RIOS, Roger Raupp. Para um direito democrático da sexualidade. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 12, n. 26, p. 71-100, jul./dez. 2006.
Texto: Ariana da Silva - Curso GDE/UFPA - 2010.