quinta-feira, 15 de abril de 2010

Histórias de morte social, racismo e gênero na Escola Pública


Histórias de morte social, racismo e gênero na Escola Pública - por Ariana da Silva*

O bairro “periférico” de Val de Cans, na cidade de Belém do Pará, protagonizou nos três últimos anos episódios marcantes em duas Escolas Públicas da Rede Estadual de Ensino, Renato Condurú e Antonio Moreira Júnior, entrando para estatística do lugar comum da violência envolvendo jovens marginalizados pela desigualdade e estigma social. No Moreira um casal de alunos, flagrados em pleno ato sexual no banheiro masculino, divulgado posteriormente no Site de vídeos You Tube, ocasionou a morte social da aluna em questão, tendo sido expurgada, humilhada e “desmoralizada” por toda a escola, reação inversa ocorrida com o aluno, exaltado por sua virilidade e performance sendo posteriormente popularizado entre os alunos. Na Renato o racismo feminino por discriminação em seu aspecto corporal, levou ao assassinato de uma aluna dentro da sala de aula por causa do seu “cabelo enrolado”, visto como sinal de diminuição da sensualidade feminina, sendo a algoz outra adolescente de 18 anos – e negra. Histórias diferentes, de violência física e simbólica, que refletem a categoria Gênero “Mulher”, protagonistas estigmatizadas que demarcam a diferença de tratamento entre “meninos” e “meninas” com o silenciamento e “isenção” da administração escolar. Desse modo, a necessidade de discutir as temáticas apontadas no artigo justifica-se pela forma como a juventude e sua respectiva sexualidade têm alcançado determinados “descaminhos” no espaço escolar. Assim o artigo pretende problematizar aspectos de observação e estranhamento sobre sexualidade, raça e gênero a fim de analisar as nuances sociais dos mesmos. A abordagem metodológica será pautada nos ensinamentos da Antropologia Social do “Olhar, Ouvir e Escrever”, espécie de métier do docente pesquisador que pretende se antropologizar englobando seus pares a partir da observação participante e que, como professora da Rede Pública (Moreira) e discente do Curso de Aperfeiçoamento sobre Gênero e Diversidade na Escola – GDE (UFPA) pretendo lançar mão da crítica social a respeito dos temas de maneira etnográfica, sensível e de “desconstrução” de valores inculcados culturalmente com o intuito de encontrar nas estruturas estruturantes da sociedade envolvida caminhos fecundos de interpretação do contexto social em que alunos e alunas da Escola Pública estão envolvidos.

* Bacharel e Licenciada Plena em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Especialista em Sociologia e Educação Ambiental pela Universidade do Estado do Pará (UEPA), Docente da Rede Pública de Ensino do Estado do Pará, Docente Credenciada da Escola Técnica do SUS – ETSUS/Regional Pará, Discente do Curso de Aperfeiçoamento sobre Gênero e Diversidade na Escola (UFPA) em andamento (2009/2010).
Imagem: Pablo Picasso

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Racismo na Escola (?)


A discriminação do racismo é reproduzida na escola em função da ausência de discussão de fatos históricos e curriculares que incluam os processos de diversidade social, étnico-racial e de desigualdade econômica como formas de compreensão da realidade social que indicam a grande heterogeneidade da sociedade brasileira.
Situações de preconceito e de naturalização da intolerância racial são veículos ideológicos que marcam profundamente as chamadas classes sociais, nos espaços públicos e privados de convivência entre "negros" e "brancos", "indígenas" e "mestiços", "pobres" e "ricos" e nas relações de poder que perpetuam a segregação, que são maneiras de manter o status quo da violência simbólica e física que ocorre diariamente quando pessoas "de cor" procuram emprego, são abordadas na rua como suspeitas, são discriminadas na escola, no trabalho, na igreja, etc. e que, dentro de estigmas sociais deflagram o racismo existente no Brasil.
A Escola tem a tarefa de contribuir para que a segregação social e intelectual seja tolida, a fim de evitar que outras intolerâncias e crimes sejam cometidos e que, finalmente, possamos combater o racismo que está "escondido" na estrutura social de exclusão e marginalização das "minorias". O Brasil é um país diverso, para isso, é preciso levantar a bandeira da diversidade étnico-racial na Escola e em todos os cantos para que a voz dos Direitos Humanos seja ouvida.

Texto: Ariana da Silva

domingo, 4 de abril de 2010

Proteção de Saberes da Floresta


(Morada Ribeirinha - Foto Arquivo Pessoal)
Os aspectos ambientais e a organização social da Amazônia precisam ser compreendidos e respeitados pelo Estado, pela Sociedade Civil, pelas ONG’s e interpretados pela Academia, fortalecendo a percepção da necessidade de “proteção de saberes” das populações e da cultura diversificada da Floresta Amazônica, que são medidas urgentes de perpetuação das espécies: fauna, flora e da natureza humana de um modo geral. São aspectos necessários para a compreensão da realidade social local a percepção, apreensão e compreensão da sustentabilidade vivenciada pelos povos tradicionais da Região Amazônica, fatores intrínsecos à sobrevivência não apenas da biodiversidade, como também da cultura milenar de populações que chegaram muito antes de nós em solo nacional, como os indígenas, que merecem plenos direitos e reconhecimentos sobre a floresta, sobre o lugar – no sentido de pertencimento – e sobre as memórias que demarcam a sua identidade e etnicidade características.
Existe uma complexidade que envolve os saberes das populações amazônicas, que possuem organização social, cultura e idéias peculiares sobre o meio ambiente, especialmente no que concerne ao "modelo" de suas práticas sociais cotidianas, como o manejo da floresta, a roça, o tempo de colheita, o respeito à natureza, o uso de plantas medicinais, o cenário ribeirinho, etc, entre inúmeras formas de sustentabilidades naturalizadas em uma espécie de "pedagodia do cotidiano", como diria Ivanilde Apoluceno (OLIVEIRA, 2008).
Os campos das discussões da questão ambiental e as propostas de “colonização” do conhecimento da floresta amazônica são temas que necessitam de uma tradução local, de uma interpretação cultural, que através de sistemas simbólicos são significados a partir de idéias de compreensão da realidade que historicamente representam o mundo, a construção de sentidos e a disposição social de comunidades sob variadas vertentes, carregadas de práticas sociais que formam recortes em relação a identidades sociais e culturais dessas populações.
A questão ambiental envolve correntes teórico-metodológicas sobre o Meio Ambiente que transitam por conceitos desde os Conservacionistas Puros até os modernos defensores do Desenvolvimento Sustentável e certamente absorvemos, através de nossa cultura, o pensamento que é utilizado na Escola, na Comunidade, na Família, na Igreja e no Estado. O que movia o pensamento da década de 70, era a veia do desenvolvimentismo: o chamado “Milagre Brasileiro”, que via a natureza como um verdadeiro entrave ao pleno “progresso” da sociedade brasileira. Diante desse panorama sócio-político, a natureza foi “moldada” de acordo com o viés da ciência positivista e ainda hoje sentimos o reflexo direto da informação desencontrada sobre o Meio Ambiente, a Sociedade e a Relação do Homem com a Natureza Mundializada, que clama por melhores condições de vida e de humanidade entre todos a fim de construir a possibilidade de proteção dos saberes da floresta, dos mitos, ritos, cotidianos sociais diferenciados e, principalmente, a proteção dos saberes intelectuais dos ribeirinhos, indígenas, quilombolas, castanheiros, seringueiros e demais sujeitos sociais da Amazônia, que historicamente perpetuaram - e perpetuam - a verdadeira "sustentabilidade" da qual necessitam...

OLIVEIRA, Ivanilde Apoluceno de. Trabalho, saberes, identidades e tradições nas comunidades rurais. In: Cartografias ribeirinhas: saberes e representações sobre práticas sociais cotidianas de alfabetizandos amazônidas. 2.ed. Belém, 2008.

Texto: Ariana da Silva


(Criança ribeirinha pescando - Foto Arquivo Pessoal)

sábado, 3 de abril de 2010

Quilombolas


Na história brasileira o processo de conquista e colonização portuguesa da Região Amazônica está relacionada a uma economia extrativista baseada na exploração da mão-de-obra indígena. Todavia, o processo de colonização desta região envolveu-se também com o estabelecimento de uma economia e sociedade destinadas às atividades agrícolas voltadas para o mercado europeu, explorando inicialmente o trabalho de populações indígenas, os quais gradativamente foram sendo substituídos pela força de trabalho escravo proveniente dos negros africanos.
Foi com esta finalidade que os negros, a partir da segunda metade do século XVIII entraram de forma efetiva na Amazônia, através do trabalho escravo e a partir desse período tornaram-se a principal força de trabalho na Região. O contingente de escravos trazidos da África, por outro lado, durante o tráfico negreiro foi disperso pela região norte, fato que possibilitou e facilitou a participação deste grupo étnico nos processos de formação e expansão das populações amazônicas, e na formação de algumas comunidades rurais contemporâneas que descendem de antigos núcleos de resistência ao regime escravocrata da sociedade colonial, chamados de quilombos, mocambos ou quilombolas.
Estas comunidades compostas basicamente de descendentes de negros africanos (quilombolas) há muito se mantêm e distribuem por toda Região Amazônica tanto através de incentivos do Governo Federal, que lhes reconhecem como descendentes legítimos dos quilombos do período colonial, como também pela manutenção das práticas de atividades de subsistências puramente extrativistas e pesqueiras na região.
A comunidade quilombola mais próxima da Região Metropolitana de Belém é a de Abacatal, que fica a 16 km da capital “contados a partir do Entrocamento e a 7 km de Ananideua, sede do município (...). Nesses quilômetros que antecedem a localidade, o modelo de ocupação e as marcas de destruição são constantes, e em alguns momentos chocantes. Os covões abertos nas proximidades da entrada de Abacatal mostram uma agressão física considerável ao meio ambiente. Grandes crateras estão surgindo e por vezes, à beira, amontoam-se lixo.” (ACEVEDO & CASTRO, p. 17-18, 1999).
Ligadas a atividades de extração de pedras, fabricação de carvão, roças e quintais, estas comunidades, assim como no passado, hoje, mantêm com características sociais o regime familiar fechado, com seus integrantes mantendo matrimônio com os membros da própria comunidade quilombola, tornando-os relativamente isolados do restante do seu entorno. Porém, estas características têm mudado em função da construção de rodovias, com conseqüente destruição da natureza, diminuição de sua produção e da área territorial dos quilombolas. Aos remanescentes quilombolas de Abacatal restam atualmente pequenas áreas destinadas à roça e as políticas de plantação de mandioca, para consumo próprio e comércio, onde os membros destas comunidades passam a ter a necessidade de exercer relações de comercio/busca de trabalho, com outras unidades comerciais de outros municípios, como Belém e Ananindeua.

ACEVEDO, R.; CASTRO, E. No caminho de pedras de Abacatal: experiência de grupos negros no Pará. Belém: UFPA/NAEA, 1999.

TEXTO: Ariana da Silva

Desigualdade Racial


A desigualdade racial é um processo que envolve a desigualdade social, econômica e cultural de um grupo sobre o outro e implica na criação de estereótipos de "cor" e "raça" típicos de sociedades que mascaram a realidade social e "camuflam" o racismo e o preconceito em ações como a que aconteceu com o personagem João: "ele serve para segurança, mas como vendedor, não!".
O negro na sociedade brasileira é alvo de uma latente discriminação e segregação social na chamada "estratificação social" e ainda ocupa cargos inferiorizados por variados processos de separação entre brancos e negros, "herança" da Colonização que trouxe consigo instrumentos ideológicos que reforçam a tese da desvalorização dos negros, indígenas e minorias sociais como seres humanos de "segundo escalão" e que, somente através dos movimentos sociais, de grupos de direitos humanos e o pensamento crítico que deve ser exercitado através da Educação, poderemos encontrar caminhos para que o racismo e a discriminação sejam postos à prova e, enfim, possamos indicar "soluções" de igualdade jurídica, social, material, cultural e simbólica em sociedade.

Por Ariana da Silva - GDE/UFPA.

Juventude e Sexualidade:


O segmento social que envolve a juventude brasileira está pautado em nuances que caracterizam uma diversidade de valores éticos, políticas públicas, leis, jurisdição, padrões de estética e rebeldia, protestos, transformações biopsicossociais, relações religiosas e de cunho moral, regras sociais, relações raciais, de preconceito e discriminação de gênero, cor e etnia e ações históricas na vida cotidiana, escolar, social, cultural e sexual.
O jovem, entendido pela UNESCO como o indivíduo entre 15 e 24 anos, está envolvido por uma rede de proteção social que cria sustentações jurídicas como o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA –, Programas de inclusão do primeiro emprego, Métodos educacionais de formação cidadã, Medidas preventivas na área da saúde, Atividades esportivas e culturais de combate à violência e segregação social da pobreza, e afins, no entanto, é relevante a necessidade de discussões acerca dos temas da juventude e da sexualidade, ainda como espécies de "tabus", que avaliam o lado "reprodutivo", do "papel da procriação", de métodos anticoncepcionais, do combate à natalidade e da esterilização feminina mais que o exercício do autoconhecimento, do respeito ao Outro e da "significação" do que vem a ser "sexo", "sexualidade", "prazer", "HIV", "hetero ou homo", "orientação sexual" como também um sem número de conceitos que fazem parte do cenário do que conhecemos por "Sexualidade", de maneira ampla.
A sexualidade juvenil é demarcada e deve obedecer a padrões que, historicamente, remetem ao casal hetero, cristão, de classe média e que convive socialmente sem necessidade de avaliação social por simbolizar o “modelo” inculcado, as demais formas de orientação sexual são vistas como desviantes e contestadas em sua normalidade psicoemocional e estão moldadas em uma moralidade estabelecida pela coerção social.
A desigualdade social é outro fator fundamental do reconhecimento da juventude, que através de formas de convivência cria grupos de pertença a fim de demonstrar que faz parte da sociedade e que, portanto, mostra-se como punk, anarquista, movimento estudantil, grupos de teatro, teologia da libertação, grupos homossexuais –, gays, lésbicas, transexuais, bissexuais, etc., e que, à sua maneira, contestam os valores impostos culturalmente e que devem ser colocados em discussão a fim de estabelecer caminhos de inclusão social e cidadania.

TEXTO: Ariana da Silva - GDE/UFPA.

Preconceito




O entendimento sobre preconceito é algo dinâmico, pois envolve relações de poder em diversas instâncias: sociais, políticas, econômicas, culturais, simbólicas e também o que aprendemos a conceituar por "raça" ou "etnia". No entanto, todas essas relações sociais que resultam em inúmeros "preconceitos" são, antes de tudo, ausências de respeito à diversidade entre os homens de todas as sociedades e culturas diferentes, que entraram em contato e obtiveram trocas sociais desde o princípio da "evolução humana" e especialmente, do despertar cultural e material das pessoas em geral, entre conquistadores e conquistados, colonizadores e colonizados, estabelecidos e não-estabelecidos e que atualmente moldam a chamada "diversidade": de gênero, cor, religião, cultural, social e etc. O respeito e a tolerância (à La Freire) à diversidade devem ser passos largos para que os preconceitos possam ser discutidos por todos a fim de sua supressão em sociedade...

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Relações Étnico-Raciais: Sociedade, Educação e Atualidade.


As teorias eurocêntricas do Racialismo – “de diferenças biológicas entre as raças: psicológica, de caráter distinto e intelectual” –, e da Eugenia – de “aprimoramento biológico da espécie humana” –, que substituíram a fé cristã e a cultura da igualdade como princípio formal entre os homens pela naturalização do preconceito de segregação de “raças” superiores e inferiores, através do cientificismo evolucionista e de expansão do Colonialismo Liberal da Modernidade, são sintomas dos processos que culminaram na intolerância da discriminação étnico-racial, em crimes hediondos contra a pessoa humana, na diferenciação sócio-cultural e moral entre os povos europeus e os “outros”, os “de fora”, “estrangeiros, “outsiders”, “párias”, excluídos ou “esquecidos” – citando o sentimento de esquecimento do povo indígena mexicano nas palavras do Subcomandante Marcos do EZLN – Exército Zapatista de Libertação Nacional (México) –, e, principalmente, a partir da massiva referência ideológica de dominação econômica e territorial que envolveu as Pátrias de populações indígenas, negras, asiáticas, “latino-americanas” e afins, que deflagram o cenário do que conhecemos hoje como Racismo: na Escola, na Sociedade e no nosso dia-a-dia.
As relações étnico-raciais são fruto de um longo caminho de desigualdade e diferenciação, baseadas no Liberalismo, doutrina que promoveu a regulação do Estado através do controle sobre a economia e das riquezas, apoiado amplamente na idéia do Individualismo e da livre concorrência; na Ciência Positivista, que através da criação de Leis Gerais converteu a fé e os processos de catequização em força social de coerção de imposição cultural européia; do Evolucionismo (Darwin), com seus “processos de evolução das espécies naturalizadas” – tribo/confederação/Estado, de forma linear e indissolúvel em consonância com a Ideologia do Estado Nacional, de forma institucional mais “desenvolvida” e de “herança” primordial, sinônimos de “civilização” e também através de experimentos tecnológicos de “superação” das formas econômicas, sociais e culturais indígenas e negras com estratégias de extermínio, cristianização, mistura racial e integração ao mercado como trabalhadores nacionais (espoliados na sua condição humana), que definiram a construção da segregação racial nos EUA, um “legado” etnocêntrico de Indianismos – visão européia do bom indígena, o bom selvagem, o “natural” com sua “bondade ingênua” –, que chega ao Brasil nos braços do colonizador luso com uma “roupagem” de homogeneização da etnia Tupi como a “única” nação cultural que reflete a imagem estilizada de nossa “etnia nacional”, confrontando desde então diversos sujeitos sociais que, dentro de sua visível e incontestável heterogeneidade, reproduzem inúmeros tipos de estigmas contra o indígena, o negro e o despossuído, com intolerâncias diversas e contundentes.
O “elevador de serviço”, o “você sabe com quem está falando”, as diferenças salariais entre brancos e negros – especialmente entre mulheres negras no mercado de trabalho, as relações de poder e de domínio social e simbólico entre ricos e pobres, a negligência do poder público em discutir abertamente os problemas de apartheid social existente em nossa sociedade, a violência naturalizada que separa “pretos” e “pobres” em baixadas, morros, lixões e favelas, o desemprego e o “trabalho análogo à escravidão” em fazendas que refletem a abissal distribuição de terras entre o Latifúndio na Amazônia e o Sem-Terra, os preconceitos de “cor” e as discriminações de toda sorte demarcam todas as relações existentes de um mundo social desigual, alarmado por uma pirâmide econômica onde poucos olham milhares e milhares do “topo” e sem previsão para que mudanças a médio e curto prazo sejam apontadas e que, finalmente, a “democracia” e a “igualdade” formal sejam estabelecidas socialmente.
Na Escola, a situação se reproduz pelo simples fato de não colocarmos em pauta a condição social de segregação entre bairros “periféricos” e “centrais”, de decodificar hipóteses de “qualidade” entre as escolas públicas e privadas de acordo com o viés capitalista, de discutir o respeito e a multiplicação da solidariedade na relação professor e aluno, da banalização da violência física, moral e simbólica, de um intelectualismo que fala e nada diz, de uma práxis de gabinete, de projetos que ao invés de incluir, excluem, separam, diferenciam; de atitudes e projetos políticos pedagógicos que são desconectados com o “mundo real” que está no próprio espaço educacional, mas também, fora dele e de infinitas “variáveis” de “atores da educação” que estão ali de corpo presente, mas não de “alma”, de “espírito livre”, como diria Nietzsche.
A atualidade reflete a história do indígena João Pankararu que, apesar de longe de sua terra, de seus costumes, de um processo de segregação interna que sofreu em busca de melhores condições para a sua aldeia, seu tekoha (“lugar onde se vive”, na língua Guarani), ainda assim manteve, ao longo da vida, laços de solidariedade étnica, com tradições religiosas bem definidas e que refletiam a peculiaridade cultural “dos seus” em relação aos “nacionais”, mesmo na “cidade grande e civilizada” e que, após o retorno a suas raízes, conseguiu a tão esperada “visibilidade” que todas as populações indígenas do Brasil de hoje tanto buscam, lutam e exigem respeito, reconhecimento e liberdade no país da diversidade.

Texto: Ariana da Silva - Aperfeiçoada em Gênero e Diversidade - UFPA/2010.

Será que o que você considera como “diversidade” realmente o é? Preconceito é sinônimo de discriminação?



A diversidade sócio-cultural é um tema atual que necessita, de fato, de uma ampla discussão. Não se pode afirmar que o preconceito é "sinônimo" de discriminação, pois corremos o risco de simplificar o contexto do preconceito e da discriminação, sendo que um leva ao outro ou vice-versa, logo, não posso considerá-los como atitudes com o mesmo sentido semântico, no entanto, envolvem conotações similares e que, dependendo do significado e da ação em que ambos ocorrem, podemos classificá-los como intolerâncias que devem ser discutidas e contestadas. Discriminar alguém por sua classe social, cor, religião ou orientação sexual leva ao preconceito contra o "pobre", o "preto", o "macumbeiro" e o "gay", todos sinônimos de estigmas sociais que estão cercados de relações que envolvem não apenas aspectos econômicos ou de "raça", entre "ricos" e "pobres", entre "heteros" ou "homos", como também situações históricas de segregação e desrespeito com o "diferente", fora dos "padrões tradicionais" da Sociedade Ocidental.
Os movimentos sociais que caracterizam a diversidade brasileira envolvem mulheres, negros, prostitutas, homossexuais, religiões afro-descendentes, indígenas, sem-terra, sem-teto e demais "minorias" são exemplos de resistências sociais que precisam ser ouvidas e estabelecidas na sociedade não como parcelas de uma sociedade à margem, mas sim como sujeitos sociais que constroem identidades e fazem a própria história, a história do Brasil, que devem ser discutidos em sala de aula e, a partir de novas idéias, estimular a construção de outros conceitos para que sejam aprimorados a fim de buscar uma nova visão de mundo e da sociedade como um todo.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Normas de Regulação da Sexualidade Juvenil


A regulação da sexualidade através de normas jurídicas, de políticas de cuidado com a saúde, com programas juvenis de aconselhamento familiar para mães e pais jovens, a realidade de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST's e AIDS) e a deflagração de direitos reprodutivos e sexuais demarcam sobremaneira o que a sociedade brasileira adotou como "regulamentação" a fim de estabelecer linhas de ação nas políticas públicas na área da saúde (Lei do SUS - 8080/90) e na área jurídica (Direitos Humanos).
A sexualidade juvenil é uma questão que necessita de discussão acerca do contexto social em que jovens de diversas classes sociais estão inseridos, através de fatos, valores morais e éticos, práticas culturais, visões de mundo locais e globais, grupos de pertença e construção de personalidades que possam vir a identificar o "homem" e a "mulher" em torno da garantia de sua própria vida sexual, que é diversa, qual seja: hetero, homo, bi ou transexual.
Muitas práticas sociais que violam direitos humanos podem ter indícios nos processos de segregação social em que homens e mulheres com menor poder aquisitivo (e de poder) estão sujeitos e são submetidos a todo tipo de violência: simbólica, física, social, cultural e humana. A homossexualidade - para tomarmos um exemplo - é alvo de "noções herdadas" de algo que, segundo Bourdieu¹, seria uma espécie de "dominação pelo capital cultural" e que, entretanto, expõe à margem da cidadania diversos grupos sociais que deveriam ter, por Lei e pela própria constituição democrática de "liberdade", seus "direitos" sociais, políticos, jurídicos, sexuais e o "direito a ter direito" garantidos, o que, lamentavelmente, não vem ocorrendo.
Todavia, a luta engajada de movimentos sociais – década de 70 até hoje – como o Feminista e o LGBT, ao longo de processos de revisões de concepções obsoletas (mudanças) nos campos biomédico, jurídico, político e social tem, na medida do possível, avançado no debate, porém, o preconceito persiste e ainda convivemos com uma espécie de desvalorização da diversidade sexual, além da de cor, classe, raça, etnia, gênero, etc.; grupos fadados a toda forma de exclusão social, classificados como "os fora da ordem" e que "não se adaptam às normas" - aos padrões culturais hetero - e, a partir da reprodução social - que acontece, inclusive, na própria escola através de agressões silenciosas - contribui para que a produção da "distinção social" de gostos de classes e estilos de vida e de poder: aquisitivo, de prestígio, acadêmico, coletivo - estimulem o apego a normas e convenções arbitrárias de sexualidade.
O direito reprodutivo - e discriminado - de mães com HIV, a homofobia - estigma do preconceito homossexual -, a reprodução simbólica da violência dentro da própria escola - com mensagens normatizadoras, silenciosas e de consentimento da violência sexual, como hierarquia, caricaturas, desigualdades, insultos, ofensas e mecanismos de exclusão -, o controle de conduta e a adaptação a regras de gênero dominantes (sexismo), que reproduzem a inferiorização da pessoa humana, com alun@s hostilizados e que comprometem o rendimento escolar e trajetórias de vida, marginalizando o (a) cidadão (ã) a uma espécie de "morte ou invisibilidade social" e de negação de sexualidades diversas, como agressões físicas a transexuais - que culminam no abandono escolar e prostituição futura, entre outras consequencias - são alguns pontos que devem servir a reflexões das estruturas sociais que compõem o cenário de busca por, efetivamente, Direitos Humanos e Sexuais na chamada Diversidade Sexual - e humana.
Direitos reprodutivos, sexuais e humanos são normas jurídicas que necessitam de uma abordagem, impreterivelmente, de afirmação de papéis sociais, de afirmação da diversidade sexual, de avanços, lutas e conquistas cotidianas. Como afirma Rios², em seu texto "Para um direito democrático da sexualidade", é na sistematização e organização de normas e condutas éticas de Direitos Reprodutivos, Democracia, Cidadania, Direitos Humanos e Sexuais numa concepção que o autor conceitua como "direito democrático da sexualidade" que, entre outros avanços, constam a ampliação de direitos sociais, políticos, econômicos e humanos em seu sentido universal.
A gravidez na adolescência possui uma simbologia de valorização social da maternidade, como um "rito de passagem" que transforma a "menina" em "mulher", que refaz o caminho da perpetuação do "papel da mulher como reprodutora" e que, no contexto social de jovens de classes menos abastadas, a atitude de ser mãe representa a constituição da vida familiar feliz e segura que não encontra dentro da própria família carregada de incertezas e descontentamentos de toda sorte e que, no entanto, pouco está relacionado ao "direito reprodutivo" propriamente dito, pois reflete justamente um comportamento baseado em limitações de relações de poder estruturantes e que estabelecem regras de desigualdades sociais acentuadas que estão na ordem do dia e precisam de reflexões e projetos formadores de atitudes críticas das experiências e convenções sociais a partir do estabelecimento de diálogos dentro da escola.
O engendramento de abordagens educativas que trabalhem o contexto social e cultural de jovens para que possam discutir o papel da maternidade, da paternidade, fertilidade, esterilidade, AIDS, estigmas, orientações sexuais, prazer, corpo - e o reconhecimento do mesmo -, erotismo, solidariedade, práticas econômicas, creches, educação dos filhos, emprego, renda e principalmente, novas emoções físicas, de envolvimentos, de amor, companheirismo e até mesmo de noções de religiosidade - e lembrar sempre que o Estado é laico, autônomo e que deve refletir na articulação de representações da sociedade civil - assim como em políticas de educação, saúde, saneamento, entretenimento, juventude, oportunidade de renda, direitos humanos, cultura, desportos, lideranças religiosas, ONG's e etc., a fim de contextualizar o que pode ser feito em termos de Direitos Humanos e atitudes solidárias, de reflexões da realidade social e também da construção de um pensamento crítico que possa relativizar o "romantismo" da vida amorosa, sexual, social, política e cultural pautada em relações de poder que moldam comportamentos e impõem regras, a fim de estabelecer caminhos fortuitos que consigam substancialmente discutir direitos de cidadania e de busca por um espaço democrático propriamente dito que possam garantir a diversidade sexual de fato, tão aclamada e urgente na atualidade.

¹ BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. EDUSP, São Paulo, 2007.
2 RIOS, Roger Raupp. Para um direito democrático da sexualidade. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 12, n. 26, p. 71-100, jul./dez. 2006.

Texto: Ariana da Silva - Curso GDE/UFPA - 2010.