segunda-feira, 22 de outubro de 2007

ECOLOGIA HUMANA COMO CRÍTICA


A ecologia humana é uma multidisciplina que surgiu como necessidade à setorização das ciências e representa uma tentativa de reintegrar o homem à natureza totalizante. A expansão do capitalismo a partir do século XVIII (Revolução Industrial) como critério econômico aceito mundialmente, tem causado conseqüências humanas e ambientais desastrosas em nome da “racionalidade” do crescimento das sociedades dominantes, sendo que a ecologia humana tenta examinar o custo-benefício desses efeitos em sua totalidade.
A área de extensão da floresta Amazônica contribui para a sua proteção e sua destruição ao mesmo tempo, pelo fato de ser inacreditável que uma imensidão de mata (de 2,96 a 4 milhões de quilômetros quadrados), possa ser devastada. Todavia, até 1970 apenas 5 milhões de hectares haviam sido derrubados, sendo que em 1988, já somavam 25 milhões de hectares, porém a área desmatada não aumentou a produção de alimentos à população brasileira.
A aventura de “desenvolver a Amazônia” nos últimos 25 anos, de fato, foi uma transferência de riqueza da União para um pequeno grupo de empresários nacionais e internacionais. A ecologia humana com sua interdisciplinaridade preocupa-se com os grupos dentro da sociedade e com os efeitos de comportamento no meio ambiente físico.
O surgimento de pressões sobre os recursos quando o crescimento populacional é intenso tem possibilidades de soluções, como: incentivo ao controle populacional; incentivo de divisão de terras e ampliação da capacidade industrial nas cidades ou abrem-se novas áreas de colonização em regiões “não-ocupadas”. O Brasil escolheu a colonização como solução e já começa a sentir suas conseqüências, pois foi mais fácil politicamente ocupar a Amazônia em vez de aumentar os impostos do Nordeste e do Sul do país: os grandes proprietários tentam evitar a coleta de impostos e, sem impostos, não existe economia eficiente, principalmente quando são gastos de forma ineficiente.
O estudo dos solos da Amazônia foi concluído juntamente com trechos da Transamazônica, como a Itaituba-Humaitá, sendo considerada ao longo de sua extensão como imprópria à agricultura, enquanto que no trecho Marabá-Altamira, os produtores perdiam sua produção pela inconclusão da estrada. Os prejuízos poderiam ter sido menores se tivessem utilizado nessas áreas uma visão de sistema ecológico humano, pois dos 5.400 quilômetros de extensão da Transamazônica, somente 1.000 quilômetros são transitáveis e em período de estiagem, sendo anualmente reparados no período chuvoso.
As conseqüências da colonização de fronteira são o despovoamento da região, a dizimação da população indígena e a ocupação militar e geopolítica da sociedade dominante, sendo que o número de ocupantes não chega ao de índios que habitavam a região na época pré-colonial. O desmatamento expõe os colonos a arbovírus, retrovírus, protozoários e leishmanioses que ocorriam em ciclos silváticos e que, com o desmatamento da floresta, o homem passou a ser o principal transmissor, aumentando os índices de mortalidade e morbidade na região. O sarampo poderia ser evitado em até 75% dos casos através de vacinas, mas continua a dizimar as populações indígenas em contato. A malária só será controlada quando as autoridades exigirem dos exploradores de minerais que cavam buracos e formam novos focos de contágio, que façam a recobertura obrigatória desses criadouros, o que poderá frear a descontrolada busca de metais preciosos na região.
A área desmatada para “botar capim” até 1988 ocupava cerca de 10 milhões de hectares em fazendas de pecuária, que com incentivos fiscais da SUDAM chegaram a 631 projetos com uma média de 24.000 hectares por fazenda, sendo que somente 92 desses projetos atingiram sua meta, o restante deixou um déficit de 700 milhões de dólares que não foram investidos em saúde, educação e transportes.
O custo ambiental foi devastador à Amazônia e à União, que não possui uma visão ecológica dos sistemas humanos: as chuvas da região são absorvidas por ela mesma e com o desmatamento, já existe uma queda pluviométrica considerável, o que poderá causar danos futuros. A Amazônia possui solos com drenagem elevada e períodos longos de estiagem (seca), o que dificulta a plantação de alimentos em 54% de suas áreas, sendo que o impacto hidrológico na região é de interesse geral.
Apesar das áreas desmatadas, não houve desenvolvimento econômico, pelo contrário: a população infantil está desnutrida, os índios continuam morrendo sem assistência médica e o homem amazônico permanece sem valorização política. O sistema de concentração de terras é o mesmo do resto do país e sem uma consciência moral da importância da justiça social a da necessidade de uma racionalidade ecológica, essa realidade não mudará. Não é necessário destruir a floresta para explorá-la: a política deve levar em conta a necessidade de alimentação, de saúde, de trabalho com salário digno e preservação de áreas verdes e a ecologia humana é um subsídio científico à compreensão dessas relações complexas do homem na Amazônia.


Resumo apresentado por Ariana da Silva na disciplina de mestrado em antropologia da UFPA: "Ecologia Humana, Sustentabilidade e Globalização", texto: MORÁN, Emílio F. A ecologia humana das populações amazônicas In: Ecologia Humana Como Crítica. Petrópolis - RJ: Vozes, 1990. p.p 283-294.

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